Entre patas e pelos

Sou meio suspeita para falar de animais porque gosto muito deles, mas hoje resolvi abrir as cortinas de meu espaço para contar algumas aventuras felinas. Tenho três gatos fofinhos e sei que muitos leitores irão franzir o nariz porque dizem gostar só de cães e que os gatos apenas se apegam à casa e não aos donos. Bobagem! Esses nada entendem dos peludinhos de quatro patas e não sabem o quanto estão perdendo por mantê-los afastados de si. Vamos aos fatos. 
Numa tarde em que o sol ainda permanecia aquecendo tudo e brilhando sobre a cidade, abri a janela de meu quarto e sobre a cobertura da garagem, protegidos por uma imensa primavera florida como um tapete cor de rosa, lá estavam eles: os gatinhos. Eram quatro e eu não sabia. Vi apenas dois olhinhos muito amarelos como o sol daquela tarde, lindos, lindos, que me fitavam fixamente. Levei um susto gostoso.  Alguém sabe o que é um susto gostoso? É quando, depois da surpresa, vem o deleite. Olhei para aquelas duas esferas douradas e elas continuaram a me fitar. Um diálogo mudo do olhar de espanto. Quem é você? O que você faz aí? Em poucos minutos eles ganharam casa, comida e carinho. E começaram as exigências.
 Água para Kelly, só corrente na torneira. Nada de água parada em vasilhas. E isso nos deliciava, porque percebemos que seu QI era elevado. Não era uma gatinha qualquer. Não era bobinha, não. Que orgulho! Para Amarelo (o nome, é claro, se colou à cor), eram importantes as saídas à noite até altas horas e só retornava quando o chamado por assobio era da pessoa certa, de quem ele mais gostava: meu marido. E o poderoso chefão da casa subia os degraus com seu dono e ia dormir ao seu lado na cama. Um aquecia o outro. Alguém reclamava? É óbvio que não. Ambos respiravam tranquilos até o amanhecer.
Ao anoitecer, não sei bem o porquê, todos corriam pela casa, fingindo um “pega pega”. Era divertido vê-los brincando, assim, seriamente. E ríamos com as cenas. Às vezes, na correria, quebravam alguma peça que enfeitava os móveis e eu ficava muito triste, mas ao vê-los assustados, como se entendessem que a brincadeira extrapolara os limites, sentia pena deles e pensava: fazer o quê? tudo nesta vida tem  um fim mesmo...
Os outros dois, Cris e Michelet, eram dóceis e caseiros e mal nos sentávamos no sofá para conversar ou ver um programa de TV e eles, ronronando, ronronando, se aproximavam devagar e se acomodavam em nosso colo e ali ficavam esperando pelos cafunés que pouco a pouco iam automaticamente recebendo, mas estavam atentos a tudo no entorno. Um dia, logo de manhã, houve um princípio de incêndio na área de serviço de uma casa vizinha.  Cris e Michelet, então, pararam diante da porta do quarto, em frente à janela que dava para essa parte da casa e, assustados, não se moviam nem desviavam o olhar da cena externa. Achamos estranho e fomos verificar. Vimos a fumaça. Os bombeiros atenderam de forma rápida ao nosso chamado e os vizinhos ficaram gratos aos fofinhos quando souberam quem detectara o perigo, além de evitar um prejuízo maior e mais grave porque toda a família ainda estava dormindo quando tudo aconteceu.
Hoje, estamos em um apartamento. Trouxemos os gatinhos, é claro. Mas só vieram três porque a Cris não resistiu a um ataque cardíaco e ficou no jardim de nossa casa antiga, junto dos outros nossos animais de estimação que, por longos anos, deram motivação às nossas atividades e alegria ao nosso viver, em especial nos momentos de solidão que nós, seres humanos, assim como os animais, encontramos imensa dificuldade para superar. E estamos todos aqui, e em harmonia. Eles não miam e não querem ir embora. Querem a nossa presença e enquanto um dorme na cama o outro escolhe o sofá e nós, que os acolhemos, nos acomodamos junto deles e também nos sentimos “em casa”.


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