Uma nova fase




De janeiro a janeiro a roda do tempo vai girando, redesenhando uma nova fase e deixando para trás as cenas que se revelaram mais representativas para cada um de nós. Umas pela alegria de vivenciarmos pequenos gestos de doçura, outras pelo compartilhamento sincero de nossas tristezas. Ou seja, é a contínua alternância de instantes de leveza e também de dor. É a vida em suas múltiplas faces. E, assim, vamos seguindo na expectativa de que haverá faróis iluminando nosso caminho.



 No dezembro último, quase  às portas do Natal, decidi me presentear. Queria algo que me trouxesse alegrias em pequenas doses e que estas pudessem se repetir quantas vezes eu desejasse. Conheci, então, a obra de Sophia de Mello Breyner Andresen, poeta portuguesa, cujo vídeo pelo You Tube trazia, além de uma biografia por meio de entrevistas e detalhes surpreendentes, a leitura de alguns de seus poemas e o relato de historinhas para os pequenos, ou para os grandes que continuam sonhando comas mesmas  aventuras impossíveis.


 Primeiro foi um livro infantil que me encantou A menina do mar. Que historinha mais singela, delicada e criativa! Acho que qualquer criança, menino ou menina, gostaria de viver aquela aventura. Uma garotinha que cabia na mão do menino que a encontrou numa praia, mas que ali não podia permanecer por muito tempo por ser uma vivente do mar e, ao sol, ela poderia secar, morrer. A trama é delicada e muito humana, com um desfecho interessante e distante do “casaram-se e viveram felizes para sempre”.  Comprei para Kevin, meu netinho, que agora já está lendo sem mim. E acho que ele vai se apaixonar pela menininha das águas profundas.
  

E para mim? Para mim, optei pela obra Coral e outros poemas, também de Sophia Breyner, que continha o poema “A solidão”. Ele se colou à minha memória, à minha visão, à minha pele, e que parece ter sido feito para mim. Mas como todos, e em todas as fases da vida, temos momentos de vazio e solidão, ele sempre encontrará um espaço aconchegante na mente dos leitores. Não resisti em mostrá-lo, aqui, aos meus amigos que se deleitam com a beleza das palavras que numa arquitetura rítmica, sonora e sintática, com repetições, paralelismos e outros recursos resgatam as imagens, as cores e as sensações de um momento sensível.


Este foi meu presente para o início das leituras de 2020. Que cada um faça uma boa escolha também e que este seja um ano memorável para todos.



A solidão


A noite abre os seus ângulos de lua

E em todas as paredes te procuro



A noite ergue as suas esquinas azuis

E em todas as esquinas te procuro



A noite abre as suas praças solitárias

 E em todas as solidões eu te procuro



Ao longo do rio a noite acende as suas luzes

Roxas verdes azuis.



Eu te procuro.

(Sophia de Mello Breyner Andersen)