Sutis incoerências

Eu queria tanto

que as impossibilidades
perdessem seu prefixo

que as paralelas
se encontrassem no infinito

que o tempo
às vezes
fosse mesmo reversível

Os novos clichês




“‘Empoderamento feminino’ é clichê constrangedor”, diz Washington Olivetto, um dos melhores publicitários que conhecemos no país, e ganhador de mais de 50 Leões no Festival de Publicidade de Cannes, em uma entrevista à BBC Brasil em São Paulo. E a quem sempre admirei, desde a criação do sedutor “O primeiro Valisère”.

E quem com mais de 40 não se emocionou com o sutiã da Valisère, aquele que “a gente nunca esquece”, produzido décadas atrás e que surpreendeu o mundo publicitário e todos que viam na Publicidade apenas uma forma impositiva de nos vender qualquer produto: “Compre. Leve. Economize”. A delicadeza e a poeticidade ali contidas para uma peça íntima que anunciava a chegada de um novo tempo para uma adolescente que, surpresa, recebia seu presente com uma mescla de timidez e encantamento, marcou positivamente e, para sempre, a carreira de Olivetto, duas vezes eleito o Publicitário do Século.

Como alguém que conhece muito a linguagem e, por isso, sabe bem o que diz, cita ainda outros chavões insuportáveis e repetidos à exaustão, hoje, como “pensar fora da caixa” e “quebrar paradigmas”, entre outros, e explica a sua aversão por eles de forma clara “São todos primos-irmãos de um baixo nível intelectual, do ‘beijo no seu coração’. A gente tem de fugir desses clichês”.

Como discordar dessa afirmação do publicitário? Esse tipo de “beijo” causa mal-estar em quem o recebe, mas passa despercebido a quem o envia por se tornar um ato irrefletido sobre a idiotice da frase, penso eu.

Ao ler essa entrevista me veio de imediato à mente as centenas de vezes que corrigi os clichês de alunos em seus trabalhos escritos ou provas e, em geral, a reação de muitos era de insatisfação, alegando alguns até que eu era exigente demais. Não percebiam eles que o que eu buscava era um pouco mais de criatividade, um aprimoramento da expressão, uma aprovação futura dos receptores aos textos por eles produzidos. O que eu desejava deles era um voltar-se para os conceitos barthesianos da escritura, da qual sempre dei muitos exemplos. E o que me conforta é que alguém como Washington Olivetto, hoje, mostra aos jovens, principalmente, que fugir dos estereótipos é o único caminho a seguir se o desejo for o sucesso na carreira.

Obrigada, Olivetto, porque as suas palavras farão eco às minhas e, por elas terem muito mais peso entre os jovens, todos nós seremos beneficiados.



Obrigada, também, à minha amiga Maria da Graça, que tão gentilmente me enviou a entrevista.