A esquina da alegria

A noite fria e já passada das onze desperta para o som do saxofone daquele artista que não foi parar na calçada da fama, mas na calçada de um barzinho lotado nos Jardins. Cada um para onde pode, e ali ele certamente ganha, além dos aplausos, um cachezinho para aquecer o ânimo e abastecer o bolso. Toca bem o saxofonista e tem bom gosto em sua seleção musical. Os jovens o estimulam com os copos nas mãos e gritos de aprovação. Final de semana é figurinha carimbada nos bares da esquina do pedaço e seus acordes avançam pela rua e invadem os apartamentos. O mundo, então, sonoro e rítmico, entra em outra dimensão e parece em paz.
Na verdade, porém, essa tranquilidade é pura ilusão. Há muito ela deixou os grandes centros urbanos, como São Paulo, Rio, e tantos outros neste tão festivo país. O que houve? Não sei. Ninguém sabe ao certo. Temos hipóteses, mas não certezas. O que sabemos é que o mundo muda e com ele o homem. Não fosse assim, ainda estaríamos grunhindo no centro das mais sombrias cavernas. E o cérebro humano evoluiu. E evoluiu para o bem e para o mal. Enquanto a ciência nos beneficiou com a descoberta do átomo, e suas inumeráveis aplicações, entre elas a recuperação da saúde do homem, a mente macabra de alguns a utilizou para o extermínio de milhões de vidas nas guerras.
É assim mesmo. O mundo não é perfeito. Sabemos disso, dessas oposições, dessas atrocidades cometidas em nome das paixões ou da demência plena dos indivíduos isoladamente ou em grupos. Basta acompanhar os noticiários. Dos pequenos furtos a crimes hediondos os nossos olhos ainda incrédulos a tudo acompanham. Mas será mesmo destino do homem caminhar para o caos? Será mesmo que nada se pode fazer para mudar essa trajetória de violência em ritmo cada vez mais acelerado?
Não tenho a fórmula mágica para interromper esse processo e creio que ninguém a tenha, mas é possível amenizá-la, evitar a sua continuidade com desfechos que têm se mostrado sempre mais trágicos. Bastaria, talvez, um contra-ataque, como acontece com o nosso organismo quando fragilizado pela invasão de vírus. Os glóbulos brancos entram em ação para destruí-los e, assim, nos proteger, mas é preciso que o nosso corpo esteja em perfeito funcionamento para poder atuar com eficiência e eficácia contra seres tão maléficos como os vírus.
A dúvida que começa a tomar conta de jovens e não jovens, hoje em nosso país, é se aqueles que deveriam tomar as decisões, na direção do Estado, estão efetivamente empenhados nessa guerra e agindo contra essa situação ou se eles mesmos a alimentam com a sua postura alienada e benevolente para com os agressores das pessoas de bem? Será que ao defender a manutenção da maioridade, aqui vigente, só aos dezoito anos, não é se posicionar a favor desses “vírus” que destroem a saúde, a tranquilidade e a vida de pais, filhos e famílias em geral que apenas desejam liberdade de sair com as crianças, andar pelas ruas e praças, a pé ou por outro meio, sem medo dos bandidos de todas as idades? Ou dos jovens que têm o direito de sair com os amigos, divertir-se, ir a barzinhos ou às baladas sem o risco de serem violentados de todas as formas, ou mortos até, pelos “coitadinhos” que “não sabem o que fazem”?
Será que as autoridades sabem que é bem melhor ouvir o som melodioso do saxofone que os gritos das vítimas dos “de menor”?

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