Domingo, às vezes, se revela um dia meio nostálgico. Para
Clarice Lispector seria um dia morno. Talvez porque a nostalgia mescle sonhos, lembranças
e saudade; e esta traz à tona alegrias e tristezas. São sentimentos que se somam,
se alternam e se confundem. E podem resultar em uma sensação oscilante. Daí a
menção à Clarice. Tão enigmática ou tão hermética ao dizer que sentia uma “felicidade
morna”. Como assim? diria hoje um jovem não iniciado na escrita da autora de A paixão segundo G.H.
É que ao rememorar alguém ou alguma passagem nós o fazemos
com um misto de júbilo e melancolia, se essa é uma boa lembrança, pois ela nos
deu prazer naquele momento, mas esse momento já não mais nos pertence, não mais
podemos repeti-lo e com as mesmas sensações. Estamos, então, diante do
inatingível. E quem de nós não vivenciou essa felicidade longínqua ou essa
felicidade incompleta. Ou essa quase felicidade? E a todo instante e em
qualquer lugar as imagens pretéritas podem num átimo surgir e se diluir em
nossa mente. É mais um mistério da nossa complexidade de ser, de existir.
São assim também os sonhos. Mistérios. Puros mistérios. Mas
dão suporte à nossa travessia. Oferecem novos traçados e outro colorido ao que já se
tornou opaco pela repetição do já vivido à exaustão. Eles podem ainda revelar outras
veredas jamais imaginadas e, então, os vazios são repentinamente preenchidos
por novos desejos, concretizáveis ou não, mas que alimentam com doçura esse agora iniciático percurso.
Enquanto isso, o tempo passa. E nós com ele. Mas pelo menos
a contínua expectativa de um outro amanhã ameniza o choque dos pequenos
desencontros e das perdas mais significativas como o daqueles antigos sonhos
que, outrora tão importantes para nós, ficaram inertes e inatingíveis pelos
caminhos. Deles, ás vezes, vem uma saudade... Mas são hoje apenas rememorações. E a vida segue.
E isso me traz à mente um poema delicado de um poeta amigo,
Jairo Fernandes:
Sobrou um vazio.
Mas, apesar das crateras,
A Lua continua linda.