A arrogância de Paulo Coelho


O excesso é sempre um risco. Seja para a saúde, seja para com os nossos sentimentos, seja para o uso que se faz da fala. Aprendi quando criança que “em boca fechada não entra mosquito”. Em tempos de Zika, então, é melhor ficar esperto.

Mas, brincadeiras à parte, é preciso falar, sim, expor as ideias, discuti-las, defendê-las... E, até onde sei, fazer críticas ao que se considera errôneo. Isso não é pecado nem crime. O erro está muitas vezes na forma, no excesso, na crítica infundada e facilmente contestável. Para evitar problemas, o bom senso não deve faltar no momento das avaliações e, me parece, que foi isso mesmo que faltou a Paulo Coelho, o escritor brasileiro que mais livros vendeu no mundo em sua nova e recente entrevista ao jornal Folha de S. Paulo (se não me engano em 04/02/16), afirmando que o texto de James Joyce é vazio, não tem nada ali que importe: “se você disseca Ulisses, dá um tuíte”, foi o que ele disse, entre outras irresponsabilidades, em especial por ser ele um integrante da Academia de Letras do nosso país.

Não é a primeira vez que Coelho procura reduzir a pó a obra de Joyce, em suas declarações infantilizadas à mídia, em geral, e ao jornal acima citado, em especial. O que há com Paulo Coelho? Não se sabe, mas que ele odeia o outro é um fato. Será por que o irlandês James Joyce foi considerado o melhor escritor do século XX, e não ele Paulo Coelho? Sabe-se lá. Em uma outra entrevista, comparou a obra de Joyce aos livros que ele, Paulo, publica, colocando seus escritos em um patamar superior pelo fato de serem estes de fácil compreensão, enquanto os de Joyce... Então, vamos atirar às chamas a obra toda do nosso também complexo Guimarães Rosa, certo?

Ora...ora..., Sr. Paulo Coelho! Bem, talvez um dia os psicanalistas possam explicar essa esquizofrenia. Enquanto isso, fica para nós o mistério e o espanto.

Mas não foi essa atitude passiva que demonstrou o crítico inglês de literatura Stuart Kelly, do jornal londrino The Guardian, diante da fala do brasileiro, que assim se posicionou em seu blog:

“Coelho está, claro, autorizado a emitir sua opinião burra, assim como eu estou autorizado a achar o trabalho de Coelho um nauseabundo caldo de egomania e falso misticismo com o intelecto, empatia e destreza verbal de camembert vencido que ontem joguei fora.”

E ainda complementou com uma resposta dada por um pensador inglês, Samuel Johnson, a um crítico, no século XVIII:
“Uma mosca pode picar um cavalo, mas o cavalo continua a ser um cavalo, e a mosca não mais que uma mosca.”

Paulo Coelho, a mosca, poderia evitar tudo isso se mantivesse a boca fechada. Mas, não, quis de novo esnobar criticando quem tem o domínio da palavra e deu Zika na história.

As cinzas depois do Carnaval


Fevereiro tem Carnaval? Tem, sim, senhor! E nada muda entre nós.

Apesar dos pesares, o brasileiro procura, nesta festa pagã, comemorar a alegria e esquecer os problemas que o afligiram durante todo o ano com a cerveja gelada na mão e o corpo em movimentação rítmica alucinada, embalado pelas marchinhas carnavalescas do presente e do passado. Depois, tudo termina. Depois, vêm as Cinzas.

Alguns, menos adeptos da folia, vão curtir esses feriados em locais mais tranquilos, mais afastados dos grandes centros urbanos onde a agitação é intensa. Faço parte desta gente estranha que, em pleno Carnaval, procura um refúgio silencioso e não liga a TV para assistir a desfiles de fantasias e de mascarados. Não tenho o menor prazer por essa mesmice colorida de penas e pedrarias. Aproveito para assistir pela Netflix, às vezes, a algum filme interessante, como os últimos que vi e revi: “O melhor lance” ou “Jogo da imitação”, filmes que nos revelam a capacidade de alguns cineastas de transformar os conflitos existenciais em arte de deleite superior. Seja pela imprevisibilidade narrativa, seja pela fotografia, seja pela trilha sonora ou pela delicadeza com que toca as fragilidades humanas. Filmes que, quando sinalizam o final, já despertam em nós o desejo de revê-los.

Aproveitei, também, estes dias de preguiça alongada para ler um novo livro de Marcel Proust, Salões de Paris, presente delicado de um amigo, ambos muito especiais, sendo a obra pelo refinamento da edição em preto e dourado, com detalhes gráficos que apontam para o requinte da “Belle Époque”na França, editado pela Carambaia; e o amigo, pela singular escolha de uma obra preciosa, uma joia literária, e de um autor de poucos leitores, mas deslumbrados como eu que leio e releio Proust, mas parece que não saio do lugar. O seu texto imagético não me deixa caminhar célere pelas páginas. Paro para reler as frases. Paro para anotar algumas delas. Paro para visualizar melhor a descrição poética dos ambientes. E é impossível resistir, aqui, ao desejo de transcrever um trechinho da última página sobre a comparação realizada por Proust entre o luar e o hermetismo, a obscuridade mesmo, dos versos de alguns poetas “o luar (...) embora reluza tão docemente sobre todos (...) há muitos séculos faz luz com a obscuridade e toca flauta com o silêncio”. Não é lindo?! É Proust!

Mas como nem tudo se pode eternizar, as leituras, os filmes ou a folia serão substituídos pelo retorno aos dias agitados de ter de conciliar o trabalho (para os que os têm, hoje) com os outros afazeres e os demais problemas do dia a dia. Tudo isso chega mais rápido do que se desejaria. E sem muito ânimo acordamos na quarta-feira de cinzas, que para os que professam a religião católica dá início à tragédia vivenciada por Cristo, e recomeçamos a nossa tragédia diária particular de ter de encarar os descalabros políticos que nos trouxeram o desemprego e, com ele, o desamparo das famílias, a impossibilidade de vencer as barreiras e o desespero de sentir-se impotente diante dos obstáculos que a falta de trabalho acarreta, sendo o mais grave deles a sensação da perda da dignidade. E muitos já vivenciaram esse sentimento. Hoje, contudo, muitos mais o experimentam aturdidos.

Que medidas drásticas sejam tomadas para que o quadro político seja alterado e possamos outra vez acreditar no futuro do país e em dias melhores que os que presenciamos, e vivenciamos atualmente, sob o manto vermelho da corrupção e do político de “alma mais pura do País”, o Sr. Lula da Silva, o ex-presidente, que nunca deixou de sê-lo, que nunca soube de nada, nunca roubou nada e não é dono de nada, nem do tríplex do Guarujá, nem do sítio de Atibaia, nem do que mais virá por aí. É tudo invenção da mídia e perseguição dos opositores.

Que a Semana Santa seja virtuosa para nós e coloque definitivamente a cruz pesada que carregamos hoje (com a inflação elevada, o dólar nas alturas, as empresas estatais e o caixa do governo arrombados, e outras questões infernais), nas costas de quem realmente deve carregá-la. E o juiz Sérgio Moro sabe melhor do que todos quem é esse cara. É Lula, claro! E ele deve fazer essa peregrinação. Aliás, já começou. Ele a merece.

Mas para isso é preciso torcer para que os deuses protejam Sérgio Moro. Vamos orar por ele!