As artimanhas da memória

A mim parece que a memória, às vezes, se comporta como um rebelde sem causa, um adolescente voluntarioso que não ouve nada do que dizemos e só dá ouvidos ao que lhe interessa. Parafraseando Caetano Veloso, a memória tem seus momentos de andar na vida “sem lenço e sem documento”. Ela vai. E vai para onde quer. Ainda que tentemos colocá-la nos trilhos de nossas recordações.
Hoje, um domingo cinzento, com cara de chuva, convidava a uma programação intimista. Por isso peguei um dos livros em processo de leitura: Os argentinos, do jornalista Ariel Palacios e me acomodei numa fofa e macia poltrona. Não era uma obra ficcional de Borges, de nos matar de inveja pela criatividade, pela erudição, mas um relato descritivo sobre a história e a cultura de um país vizinho, quase irmão, que amamos e odiamos simultaneamente tanto quanto eles a nós. E ninguém sabe explicar de forma clara e plausível o porquê, se bem que um outro escritor argentino, Marcos Aguinis, tentou fazê-lo em uma obra memorável O atroz encanto de ser argentino, comparando em detalhes as semelhanças que nos definem e, por isso mesmo, nos separam.
A obra, ainda no início, ao falar do General Galtieri, um dos ditadores argentinos, traz à tona a sua tresloucada declaração de guerra, em 1982, ao país sob o comando da Primeira-Ministra Margareth Tatcher, mulher de fibra e competência inigualáveis, morta há menos de um mês, e o final dramático para o povo argentino que no início, seduzido pela fala eufórica de Galtieri, acreditava em sua força bélica para enfrentar os britânicos, muito melhor preparados.
Mania de grandeza dos ditadores da América do Sul que pouco valor dão à vida dos que os seguem até à morte gratuitamente, como ocorreu nessa frustrada Guerra das Malvinas, e que é novamente desejada por Cristina Kirschner, uma déspota que está levando a Argentina à bancarrota. Fico pensando: será que a população vai aderir outra vez a esse discurso falacioso de uma ricaça que tira dos pobres para multiplicar sua imensa fortuna, embora diante dos microfones jure, com toda a ênfase, lutar em seu governo pelos pobres e oprimidos da nação platina? Será que já esqueceram dos mais de seiscentos soldados mortos apenas para satisfazer o ego de um orgulhoso ditador que não conseguia reerguer a economia da Argentina à época e, assim, buscou na exaltação ao nacionalismo, através de uma guerra sangrenta, o respeito da população? Será que veremos essas cenas pela segunda vez?
Pois é, a memória nem sempre se comporta como deveria para evitar transtornos em nossa vida. Há coisas que não se podem esquecer. Lá na Argentina como aqui, em nosso país, é perceptível que as pessoas se esquecem com muita facilidade das mazelas políticas que tanto mal fazem à população. Aqui, vivemos por décadas e décadas o inferno da inflação que fazia com que o salário, em especial o salário do pobre, minguasse a cada mês. Se a compra do supermercado resultava em 120, no mês seguinte era de 160, no outro de 200 e pouco, e o salário era o mesmo.
Com o Plano Real, um estudo sério e de resultado eficaz, elaborado no governo Fernando Henrique, pela primeira vez acabou com o monstro devorador de salários e trouxe o crescimento econômico tão aclamado pelo governo do PT, mas que não foi o responsável por ele. Aliás, Lula e o PT foram críticos ferrenhos do Plano Real, quando em elaboração, e acabaram dele sendo os maiores beneficiários. O país se desenvolveu, a população teve emprego e o salário manteve o poder de compra. Lula, todo gabola, assumiu a paternidade do feito e a população sem memória passou a repetir que graças a ele melhorara de vida. “Pobres ignorantes! ”, diria Guimarães Rosa.
Parece que a memória retém o que quer apenas e deleta o que bem entende, ajudada, é claro, pela propaganda enganosa que enche as telas de nossas TVs e nos impede de estabelecer relações, distinguir quem é quem e, assim, concluir que, por ineficiência e forte corrupção do governo atual, que só gastou, e nada investiu para o crescimento do país, a caixa de Pandora foi aberta e de lá estão saindo todos os males que estavam escondidos, camuflados, como hospitais sem leitos, sem médicos e sem estrutura; escolas ineficientes, estradas sem condições de tráfico; aeroportos em perfeito abandono e uma inflação galopante e desenfreada.
Será que para desviar a atenção do povo da desastrada economia com os preços incontroláveis corroendo os salários, somando-se aos demais problemas, a Presidente Dilma, copiando a vizinha Argentina, vai querer também declarar guerra a algum país de direita? Ou vai mesmo calar a mídia e acabar com os três poderes para sozinha reinar sem os reclamos da oposição? Sabe-se lá?! Que os deuses nos protejam desses desvarios!

O amor é lindo!

Neste último final de semana, o ex-presidente Lula ofereceu uma festa à ex-primeira-dama, pela passagem de seu aniversário, demonstrando assim seu grande amor por ela. Que lindo! Em especial depois de tantos rumores contrários em que a mídia noticiou suas noites "calientes" no aerolula com a outra, a Rose. Lembram-se? Ela, a Rose, anda sumida das manchetes, assim como os demais integrantes da Operação Porto Seguro O que houve? Mas como Lula é um político de moral ilibada, e a favor de direitos iguais para todos, deve estar organizando, em surdina, é claro, uma festa de arromba para comemorar, também, e com a presença de Ministros e Ministras e de toda a mídia, o aniversário da ex-segunda-dama. Vamos aguardar.




Obs.: Este texto foi enviado ao "Fórum dos leitores" do Jornal O Estado de S. Paulo, ontem, e publicado hoje (10/04/13) nesse espaço do Estadão on line. Contudo, como a expressão "segunda-dama", conforme o jornal poderia resultar em problemas (leia-se censura/ processo...) ele foi substituído por "aniversário dela", mas por erro foi digitado "aniversário dele". E esse erro resultou numa total destruição do sentido. Que pena!